Convidadas 2018: Mirela Estelles e Amarilis Reto (São Paulo / SP)
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Um outro olhar e uma nova escuta
Quando, em 2011, a coordenadoria do MAM (Museu de Arte Moderna) desafiou Mirela Estelles, educadora e contadora de histórias, e Amarilis Reto, professora de surdos e intérprete de Libras, a prepararem uma narração de histórias bilíngue (em português e Libras), propondo uma soma artística de narração simultânea, unida, ao invés da habitual tradução feita paralelamente, não imaginavam que uma nova e sensível parceria estava nascendo.
Mirela já contava histórias e, inicialmente, trouxe de seu repertório o conto “A princesa e o sal”, a partir do qual as duas iniciaram a busca por palavras, gestos, brincadeiras, a poética e a melhor combinação de seus corpos, com a intenção de transmitir toda a força, poesia e beleza das histórias para todos os tipos de público.
Assim surgiu, pioneiramente, o projeto “Histórias para ver e ouvir”, fundamentado na narração conjunta, em parceria, ao invés da narração oral seguida de tradução em Libras. Amarilis diz: “Não havia pessoas contando histórias em português e em Libras quando começamos”. Ela relata, ainda, que grande parte das pessoas surdas que participavam de suas atividades não haviam tido acesso às brincadeiras populares costumeiramente presentes em nossa cultura da infância. Assim, durante o processo criativo, elas foram buscando as brincadeiras que permeavam as histórias escolhidas, casos de “O príncipe serpente”, “O espelho mágico”, “A casa mal assombrada”, “A descoberta” de Jonas Ribeiro, “O pote vazio” e “Mãos de vento e olhos de dentro”.
Elas destacam como fonte de pesquisa e inspiração obras como “Acordais”, de Regina Machado, “Abra a roda Tin Do Le Le”, de Lydia Hortélio e Antonio Nóbrega, e artistas como Gislayne Matos, Cristiane Velasco e Lucilene Silva. Assim, foram voltando sua escuta, seu olhar, suas vozes e corpos para romper o silêncio e o isolamento daqueles que não ouvem, trazendo histórias visíveis, brincáveis, poéticas e vivas.
Em relação aos aspectos técnicos elas ressaltam, por exemplo, o uso de ambos os corpos para a ampliação de um sinal, narrar e não dramatizar, usar objetos sem excessos ou exageros, manter a igualdade de importância das duas línguas, sem hierarquia entre elas, mantendo a alternância entre quem fala e quem sinaliza.
Na voz das duas contadoras reverbera também a importante missão de fazer a Língua Brasileira de Sinas (Libras) estar presente em tantos lugares e ocasiões quantos forem possíveis para, dessa forma, propiciar cada vez mais oportunidades para que todas e todos tenham acesso a qualquer informação e também, claro, às artes. Com essa busca e dedicação na construção de uma forma harmônica e poética de narração bilíngue, Mirela e Amarilis nos trazem, neste oitavo Boca do Céu, uma bela reflexão sobre a real escuta e a ampliação de nossos sentidos.
Saiba mais sobre o trabalho delas: https://brasileirinhos.wordpress.com/2016/03/10/historiasparavereouvir/