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MAGALHÃES, J. V. C. O Selvagem. (1876) Rio de Janeiro: Typografia da Reforma.

voltar à biblioteca 9 de abril de 2016
O Selvagem

Trabalho antropológico que contempla aspectos culturais, econômicos, geográficos, linguísticos e mitológicos de povos indígenas brasileiros. A primeira parte da obra, Curso da lingua geral, segundo Ollendorf, comprehendendo texto original de lendas tupìs, é uma gramática pedagógica organizada de acordo com o método de Ollendorf. (…)

Traduzido e editado em francês, inglês, alemão e italiano (Alfaro 2004:57), o livro causou impacto nos campos então incipientes da antropologia, etnologia e linguística brasileiras (Cf. Romero 1888). Pelo elenco de autores que citaram Couto de Magalhães, conforme Leite (1936), tem-se ideia do impacto – tanto positivo, quanto negativo – do seu trabalho entre seus contemporâneos e a geração que o sucedeu. (…)

Em atendimento às solicitações do Imperador, Couto de Magalhães compôs um livro prático sobre a língua e os costumes tupis, destinado a constituir um corpo de intérpretes bilíngues, capazes de promover a integração do índio na sociedade civilizada. Além do alcance pragmático, Couto de Magalhães tem consciência do eventual alcance científico das suas observações. (…)

[O autor] inaugurou na emergente antropologia e linguística brasileiras a observação direta como método de recolha de dados, o que o levou a prestar particular atenção ao som e à sua representação escrita, que deveria ser fonética. Adotou para tal o alfabeto fonético de Magnus Lepsius e descreveu detalhadamente, na primeira parte do seu Curso, as características fonéticas e prosódicas da língua, bem como as convenções que adotou para representá-las. (…) Os textos e comentários que permeiam suas lições gramaticais revelam-no um autor conhecedor não apenas da tradição descritiva do Tupi – refere-se às gramáticas de José de Anchieta (1595) e Luiz Figueira (1621), aos dicionários, aos catecismos; aos trabalhos mais recentes como os de Faria (1858), Gonçalves Dias (1858), – mas também do Kiriri, Quechua e do Guarani; bem como do clima intelectual do período. (…)

Do ponto de vista da descrição gramatical, ainda que se possa surpreender no seu texto certa terminologia gramatical mais tradicional, (…) seu ponto de vista sobre a estrutura gramatical da língua, que consistiu em deslocar a análise do nível da ‘palavra’ para o do componente da palavra (i.e. do ‘morfema’, como diríamos hoje) é original nesta tradição. (…)

Couto de Magalhães traz propostas que se revelarão inovadoras para a descrição da língua: a adoção de um alfabeto fonético; a distinção explícita entre modalidade oral e modalidade escrita de língua, e a consequente distinção entre ‘som’ e ‘ortografia’; a língua falada como objeto de observação.

Fonte: http://www.fflch.usp.br/dl/documenta/fichas_descritivas/Magalhaes_1876.htm